Horizonte no olhar, por Studio Gabriel Bordin
Da arquitetura modernista brasileira à integração com o cenário natural que abraça a casa, o projeto explora todas as potencialidades oferecidas ao longo do caminho para a concepção de espaços leves, amplos e atemporais.
A tela em branco que recebe as pinceladas de um artista é transformada a cada gota de tinta que chega à sua superfície. Gestos simples traduzem no desenho o que antes existia somente na cabeça do ilustrador, que materializa, movimento a movimento, uma obra de arte. Na arquitetura, o terreno é a representação dessa ideia: um espaço vazio que ganha forma e sentido a partir das ideias do seu criador. Assim foi a concepção desta casa assinada pelo Studio Gabriel Bordin, lar de um casal de empresários, suas duas filhas e Pipo, o pet da família.
Inspirado pelo cenário paradisíaco de um dos bairros mais arborizados da Ilha de Santa Catarina, o time explorou a beleza natural em cada detalhe da composição. Não poderia ser diferente, já que a escolha pelo local, precedendo o próprio projeto, se deu ao grande potencial da região. Optou-se, então, pelo endereço que viria a receber o projeto de 625 metros quadrados.

Desde o início, o terreno cumpriu o papel de protagonista, guiando as decisões a partir de suas características naturais. Nele existiam rochas que foram detonadas para dar lugar à camada inferior. Os elementos se transformaram nos muros da edificação. “Toda pedra que existe ali veio do próprio terreno. Focamos em manter o máximo possível, como é o caso da pedra ressaltada na fachada, da que abraça a piscina e das que compõem o subsolo”, explica Gabriel.
Pontos-chave
• O muro feito com pedras originadas no próprio lote se mistura à fundação. O elemento ganhou altura suficiente para garantir privacidade no pavimento térreo, ao mesmo tempo em que permite a entrada de luz natural e a vista para o mar.

• Em meio a um dos cenários mais preservados da cidade, a casa é emoldurada pela vegetação local, que pode ser vista em todos os ambientes, especialmente nos espaços sociais com pele de vidro.

• A poltrona Mole, ícone do design moderno brasileiro criado em 1957 pelo saudoso Sergio Rodrigues, pertencia ao acervo da família. Atemporal, a peça foi integrada à proposta.
A linearidade da marcenaria acompanha a arquitetura da casa. A fim de chegar a uma estética limpa, o painel de fundo da cozinha abriga o acesso à lavanderia e às circulações verticais.

Em tons acinzentados, os armários e a ilha em pedra natural Quartzito Ganesh contrastam com os tons quentes do piso e dos bancos Thopin, Zanini de Zanine. Gabriel conta que a ideia é que o paisagismo seja sempre coadjuvante na arquitetura, sinalizando as cores, as entradas de luz e as mudanças de estação, como cenário vivo.

A conexão com a natureza se dá nos traços arquitetônicos e na valorização da essência dos materiais eleitos para a proposta, como a madeira e o concreto.

No pavimento superior, a circulação entre os dormitórios flutua sobre a área social. As suítes dispostas em eixo longitudinal são permeadas pela paisagem e pelo sol da manhã.

Felicidade multiplicada por dois. Moderno, lúdico na medida e permeado por elementos que proporcionam extremo conforto, como a cabeceira estofada, o espaço criado para as duas irmãs esbanja a jovialidade e a personalidade das moradoras.

A proposta desconstrói as ideias literais de um quarto infantil, criando uma composição contemporânea com papel de parede geométrico, paleta de tons coloridos e equilibrados, além de estruturas que remetem à fase atual das moradoras, sem causar ruídos visuais.

Detalhando
1. Criação de Zanini de Zanine, um dos principais nomes do design contemporâneo brasileiro, os bancos Thopin, feitos em aço carbono e revestidos de couro, foram eleitos para a bancada da cozinha, junto ao Quartzito Ganesh.

2. O marcante eixo horizontal tem como ponto de centro a sala de jantar, que fica sob o pé-direito duplo e a passarela do setor íntimo da casa, criando um segundo eixo, o vertical, que com o recurso de grandes vidraças emoldura outra perspectiva da rica relação com o exterior. Com linhas orgânicas e puras, o pendente Mamma, de Ronaldo Mafra, é uma cápsula branca com luz difusa que se funde com a paisagem. “É um elemento escultórico, que não briga com as outras peças de design”, conta Gabriel.

3. A casa adota uma planta longilínea para tirar partido das potencialidades e recursos naturais da locação. “O térreo, um vão livre sobre pilotis, respeita e se apropria dessa espacialidade, de forma que com grandes esquadrias de vidro, a área social e o jardim se mimetizam – vegetação tropical, rochas, o muro de pedras, árvores e o céu são as paredes que abraçam o eixo linear de cozinha, jantar e estar”, revela o arquiteto.

4. O painel de TV da sala de estar engloba o volume do lavabo e se torna também o anteparo do hall de entrada, assim como ocorre no outro extremo da planta. O espaço social conta com um duo de poltronas Diz, um dos clássicos da produção de Sergio Rodrigues. Leve e extremamente confortável, graças à sua dupla curvatura, a peça é fabricada inteiramente em madeira.
